quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Mindfulness - Atenção Plena para lidar com os desafios da parentalidade

Mindfulness é um estado de atenção que pode ser traduzido para português como Atenção Plena. É um estado em que prestamos atenção ao momento presente, livres dos julgamentos e análises que, geralmente, estão presentes a maior parte do tempo na nossa experiência.

Este é um estado cujos benefícios têm sido cada vez mais estudados, compreendidos e reconhecidos pela ciência e que tem vindo a ser cada vez mais usado em vários contextos terapêuticos. (Pode ver aqui uma descrição mais pormenorizada dos benefícios do Mindfulness.)

Enquanto pais, este estado tem a grande vantagem de nos tornar mais capazes de estarmos verdadeiramente presentes quando estamos com os nossos filhos, o que nem sempre é fácil quando não conseguimos deixar de lado as preocupações e distracções que, tantas vezes, enchem a nossa atenção. E a verdade é que as crianças precisam da nossa presença física mas também emocional. Para uma criança sentir que importa na nossa vida ela tem de sentir que quando estamos com ela gostamos de estar com ela, tem de sentir que temos prazer ao conversar com ela, ao brincar, etc. E, se estamos com a cabeça cheia de problemas ou de outras distracções que não conseguimos eliminar será mais difícil transmitir-lhe esse prazer e fazer com que a criança sinta que é importante na nossa vida.

O mindfulness pode ser uma excelente ferramenta para nos ajudar a ser capazes de estar mais presentes o que, neste caso, terá um grande benefício para os nossos filhos mas também para nós: porque nos permite usufruir verdadeiramente da ligação que temos com eles e que pode ser uma grande fonte de prazer, de realização e de felicidade. Quantas vezes nos focamos mais nos problemas do que na maravilha e no privilégio que são ter uma criança aos nossos cuidados, que depende de nós e que podemos ver crescer, com quem podemos partilhar a descoberta maravilhosa de estar vivo e de aproveitar cada momento?

Ninguém se esquece da sensação avassaladora de amor incondicional que sente ao ver um filho pela primeira vez. Podemos pensar que Isto acontece por causa de todas as hormonas que estão envolvidas no parto (e que já sabemos que se alteram também nos homens) mas isto não será suficiente ara o explicar. Nestas alturas entramos, espontaneamente,  neste estado de atenção plena: voltamos toda a nossa atenção para conhecer aquele bebé sobre quem ainda não fazemos julgamentos, avaliações e limitamos-nos a estar conscientes de que podemos depositar naquele ser todo o nosso amor, toda a nossa atenção, pelo menos durante os primeiros instantes. E este estado pode prolongar-se durante várias horas ou dias mas, geralmente, acaba por desaparecer. Porquê? Por vários motivos: por um lado porque nos habituamos aos nossos filhos e, ao deixar de ser novidade esta ligação que temos com eles mais facilmente passa para segundo plano na nossa atenção, por outro lado também porque muitas vezes começam a surgir os medos, preocupações ou inseguranças que acabam por estar mais presentes e ocupar uma boa fatia da nossa atenção e também porque, à medida que os meses vão passando começamos a fazer muito mais julgamentos e avaliações que também podem condicionar esta nossa capacidade de estar simplesmente presentes. Por exemplo, se o nosso filho faz alguma coisa de que não gostamos, pode surgir o medo de não o estarmos a educar correctamente, a preocupação com o facto dele poder ter ou não más intenções, o receio de que os outros o julguem ou nos julguem a nós por não sabermos controlá-lo, etc. E, muitas vezes, estas preocupações acabam por estar tão presentes que não nos deixam desfrutar dessa sensação maravilhosa que é o amor de uma mãe ou pai pelo filho.

Esse amor nunca deixa de estar presente, o amor pelos filhos nunca desaparece e até há quem sinta que cresce mas, a verdade, é que deixamos de o colocar em primeiro plano nas nossas vidas e na nossa consciência. Porque achamos que há coisas mais importantes para resolver ou decidir ou porque simplesmente não somos capazes de permitir que a nossa mente se desligue dos julgamentos, avaliações e preocupações constantes que nos ocupam durante a maior parte do tempo. Então o treino de mindfulness permite-nos começar a ser mais capazes de direccionar a atenção e, quando estamos com os nossos filhos, não há nada melhor do que sermos capazes de focar a nossa atenção no amor que temos por eles, livres dos receios, medos, preocupações e ansiedades que, tantas vezes são o foco na nossa atenção e nos impedem de ver o resto. E há já muitos estudos que compravam o efeito positivo para a nossa saúde física e mental de sermos capazes de nos centrar neste tipo de sentimentos.

Por outro lado também pode acontecer que haja uma certa habituação ao que sentimos pelos nossos filhos e que, por isso, isto deixe de ser uma fonte tão intensa de prazer. Uma das descobertas que a ciência fez acerca do mindfulness é que nos permite ver as coisas sempre com um olhar fresco, com uma percepção mais apurada. isto acontece porque o mindfulness nos permite desligar um pouco dos pré-conceitos e pré-concepções que, geralmente, vamos fazendo acerca da vida. Então esta prática ou este estado permite-nos olhar para tudo como se fosse a primeira vez, com a frescura do olhar de uma criança. Isto é algo que nos pode ajudar muito a saborear mais a vida e a aproveitar cada momento mas, na parentalidade, isto pode tornar-se ainda mais valioso, permitindo-nos apreciar esse sentimento diariamente, olhando para os nossos filhos como se fosse sempre a primeira vez que os vemos. Livres de todos os condicionamentos que a nossa experiência nos faz ter e que limitam essa nossa capacidade  de estar verdadeiramente na presença deles e de nós próprios com tudo o que sentimos por eles.

Atenção Plena para ajudar a quebrar o ciclo 

Por outro lado, o mindfulness também nos pode ajudar a curar algumas feridas da nossa infância. Porque todas as crianças precisam de sentir esse amor incondicional e essa presença da parte dos pais mas nem sempre os têm e isso acaba por deixar marcas.

Os nossos filhos aprendem a ver-se tal como nós os vemos. Se os vemos como seres dignos de amor e de respeito e somos capazes de lhes transmitir isso eles aprenderão a ver-se também assim. Se formos capazes de transmitir aos nossos filhos o amor que sentimos por eles, com actos e com palavras, através dessa presença e disponibilidade afectiva que lhes diz que estamos presentes - eles, mais facilmente, aprenderão a amar-se também a si próprios. E, na verdade, essa é provavelmente a falha que está na origem de todas as perturbações psicológicas: a falta da capacidade de nos amarmos verdadeiramente a nós mesmos. A falta de nos vermos como seres intrinsecamente dignos, válidos e merecedores de amor, de carinho e de respeito.

E, quando temos essa falta, quando uma parte de nós não está totalmente certa do seu valor ou da sua dignidade, ou da sua competência, é mais difícil acreditarmos e transmitirmos aos nossos filhos que são seres válidos, dignos desse amor e respeito incondicionais. Então, quando isto não acontece gera-se um ciclo vicioso que se torna difícil quebrar.

E, é aqui que, mais uma vez, o mindfulness nos pode ser muito útil. Um investigador americano, Daniel Siegel, descobriu que o treino de mindfulness activa no cérebro um padrão muito semelhante ao que é produzido pelo apego do tipo seguro (ver artigo sobre os vários tipos de apego ). A forma como nos ligamos aos nossos pais produz um determinado padrão de apego que, por sua vez, produz um determinado padrão cerebral que irá moldar e influenciar toda a forma como encaramos o que nos rodeia e como nos relacionamos com os outros. E, se não fizermos algo para compreender as nossas experiências e o tipo de relação que tivemos com os nossos pais, as estatísticas mostram que, o mais provável, é que estabeleçamos com os nossos filhos o mesmo tipo de padrão que tivemos com os nossos pais.

Mas, através de uma prática de mindfulness podemos alterar esse padrão e, assim, podemos finalmente quebrar esse ciclo. Isto acontece porque, durante esta prática, aprendemos a dar a nós mesmos justamente aquilo que todas as crianças precisam: a nossa presença, uma presença autêntica, genuína, livre de julgamentos e de avaliações; uma presença de amor e de aceitação incondicionais, aceitação por quem somos e pela fase da vida em que estamos. Isto quer dizer que aprendemos a encontrar dentro de nós aquilo que, muitas vezes, levamos uma vida inteira a procurar fora. Porque quando esta falta existe e nem nos damos conta disso a nossa tendência será sempre para procurar relações e situações que a possam preencher. Procuramos nos outros a tal segurança que não encontrámos nos nossos pais e exigimos que estejam presentes e disponíveis tal como queríamos que os nossos pais tivessem estado. Ou, pelo contrário, quando fomos tão feridos que passou a doer muito procurar esse amor nos noutros, acabamos por nos fechar e acreditar que não precisamos de ninguém para ser felizes e estar bem. Mas, acontece que, por mais que queiramos acreditar que não precisamos de ninguém ou por mais que os outros nos dêem aquilo de que achamos precisar, quando esta falta vem do nosso passado, do nosso interior, não há nada no exterior que a possa compensar. Mas o mindfulness permite-nos perceber que, apesar dos nossos pais não o terem sabido demonstrar da melhor forma, somos realmente dignos de amor e dá-nos a possibilidade de perceber que podemos amar-nos de forma verdadeiramente incondicional, apesar de não o termos aprendido a fazer em crianças.

Termino este texto com um diálogo que tive com o meu filho de três anos que demonstra a forma como as crianças aprendem o amor próprio:

Filho - Mãe tu gostas de mim?
Eu - Gosto filho.
Filho - Eu também gosto de mim! Gosto de mim da mãe e do pai!

No meu livro Mindfulness Yoga - Atenção Plena para Lidar com os Desafios - descrevo os benefícios deste estado e a forma como pode transformar a nossa relação connosco mesmos e com o mundo. Neste livro podem encontrar também um programa de prática para ser seguido, em casa, ao longo de doze semanas, acompanhado de um Cd com meditações guiadas, que permite conhecer e integrar os benefícios desta prática no nosso dia-a-dia.

No próximo dia 1 de Novembro irei também começar um Curso de oito semanas onde vamos experimentar, compreender e explorar a forma como podemos tornar o mindfulness parte da nossa vida e usufruir de todos os seus benefícios. Para saber mais sobre este curso pode ver aqui
Se quiser mais informações sobre o livro ou sobre o curso pode escrever-me para inforvida@gmail.com



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