quarta-feira, 22 de maio de 2013

Porque é que temos tanto medo que os nossos filhos precisem de nós?


Há uns anos fui visitar um bebé que tinha nascido há pouco mais de quinze dias, quando cheguei a casa dos pais, o bebé estava deitado numa daquelas cadeiras reclináveis próprias para bebés, colocada no chão da sala e nós, adultos, ficámos sentados no sofá a olhar para ele durante algum tempo sem que ninguém lhe pegasse. Passado algum tempo chegou a avó do bebé e, com o seu instinto de avó, assim que o viu deitado na cadeirinha pegou-lhe logo ao colo. Ao ver isto a mãe refilou com ela dizendo que o estava a habituar mal e que não tinha tempo para estar com ele ao colo sempre que começasse a pedir. Isto passou-se há uns bons anos, na altura eu ainda não tinha filhos, mas nunca mais me esqueci das palavras daquela mãe, dedicada e orgulhosa do seu filho, como todas as mães recentes mas cheia de medo de lhe criar maus hábitos se lhe pegasse ao colo sempre que ele queria.
Anos mais tarde, quando tive o meu filho, muitas pessoas me diziam que não podia andar sempre com ele ao colo e que se lhe pegasse sempre que ele chorasse ficava habituado a isso e poderia manipular-me facilmente. Nunca segui estes conselhos e sempre peguei no meu filho aos primeiros sinais de protesto mas, o que é certo, é que, durante os meus primeiros tempos como mãe, quando via que o meu filho não passava mais do que uns dez ou quinze minutos na cadeirinha de plástico colorido que, com tanto cuidado, tínhamos escolhido para ele e que nem a vibração que a cadeira fazia se carregássemos num botão, nem os bonecos coloridos pendurados ao alcance dos seus braços, serviam para o demover de protestar e gritar se ninguém lhe pegasse ao colo, comecei a pensar que estaria a fazer algo de errado e as tais vozes de que estaria a deixá-lo mal habituado começaram a fazer algum eco na minha mente. Felizmente que não dei muitos ouvidos a esses ecos e, à medida que o tempo foi passando e fui lendo mais sobre estas questões e ganhando mais confiança no meu papel de mãe fui percebendo que, essas ideias de que não devemos pegar muito nos bebés ao colo, ou que não devemos dormir com eles, ou dar de mamar até muito tarde, ou que devemos deixá-los chorar um pouco, estão a ficar cada vez mais ultrapassadas pelos novos conhecimentos que se vão fazendo na área da psicologia do desenvolvimento. Começa a haver uma sólida base de estudos e investigações que mostram que os bebés cujas necessidades são respeitadas – e a necessidade de contacto físico num bebé é quase tão forte como a necessidade de comer ou dormir – se tornam crianças muito mais felizes, seguras, confiantes, capazes de estabelecer relacionamentos significativos saudáveis, mais fáceis de educar, com menos problemas de comportamento e melhores resultados escolares.

Muitas observações mostram que os bebés que passam mais tempo no colo choram menos e têm muito menos episódios das chamadas cólicas. E também já existem estudos que demonstram que os bebés que têm mais contacto físico com os pais crescem tornando-se crianças mais seguras, confiantes e melhor adaptadas e capazes de estabelecer bons relacionamentos.

Mas, muitos pais dos nossos dias, continuam com medo que os seus filhos nunca se tornem independentes se lhes derem todo esse contacto físico de que necessitam. Então vemos cada vez mais bebés e crianças pequenas que passam o dia em contentores de plástico em vez de estarem em contacto com o corpo do pai ou da mãe, ouvindo o seu coração, sentindo o seu cheiro, sentindo-se seguros e contidos nos seus braços. Na verdade o ser humano, como já dissemos noutros artigos, nasce com um elevado grau de dependência e um bebé pequeno vem de um mundo onde nunca sentiu fome, calor, frio onde os ruídos são sempre constantes, onde vivia no abraço constante do liquido amniótico num estado de semi-fusão com a sua mãe. Quando o bebé nasce, essa fusão que existia com a mãe não desaparece imediatamente. Durante os primeiros meses de vida é perfeitamente observável que os bebés reagem aos estados emocionais das suas mães: se a mãe está tranquila e feliz o bebé também estará, se, pelo contrário, a mãe fica nervosa e agitada o bebé irá demonstrar isto rapidamente. Na verdade os bebés, sobretudo durante o primeiro ano de vida, podem ser um óptimo espelho das emoções da sua mãe. Então, se esta ligação tão forte existe, é muito natural que o bebé, que ainda não se sente um ser completamente separado nem autónomo, precise desesperadamente do contacto com o corpo da mãe que ajuda a regular o seu próprio corpo. O pai, se estiver muito presente, também pode servir como um bom substituto mas, nas alturas de maior aflição, nos primeiros tempos de vida, não há nenhuma outra ligação que possa substituir aquela que o bebé tem com a mãe a quem esteve ligado durante os seus primeiros nove meses de existência. É possível observar que, quando os bebés estão ao colo das mães, o seu ritmo cardíaco fica mais regular, a respiração mais tranquila e todo o seu metabolismo parece adoptar um ritmo mais equilibrado. E, se a mãe estiver calma, o bebé começa também a segregar hormonas associadas a sensações de prazer e bem-estar. Hormonas que a mãe, em contacto com o bebé, também segrega como a oxitocina e as endorfinas que podem até ser um importante factor para prevenir a depressão pós-parto e para fazer com que a mãe se sinta segura, tranquila e confiante no seu papel de mãe. 
Então porque é que temos tanto medo deste contacto físico que é essencial para o bom desenvolvimento do bebé e da criança?

Muitos pais têm medo de andar com as crianças ao colo, medo de dar de mamar até tarde, medo de dormir com os filhos, medo que as mães fiquem em casa muito tempo com as crianças em vez de irem para a escola. E todos pela mesma razão: às vezes parece-me que vivemos uma espécie de pânico colectivo, na nossa sociedade, de que os filhos nunca mais larguem as saias da mãe.

E, na verdade, essa tão almejada independência nunca chega a existir de verdade. Porque todos precisamos de alguém. E as pessoas mais felizes são justamente as que o sabem e são capazes de lidar com isso da melhor forma. A Psicologia Positiva, com base em muitos estudos, mostra que as pessoas mais felizes são justamente aquelas que têm melhores relacionamentos, porque o ser humano é um animal social. Desde que nascemos que precisamos de criar laços e precisamos de sentir que os outros nos ouvem, nos compreendem e nos apoiam.

Então porque é que temos tanto medo de ouvir e apoiar os nossos bebés e crianças?

Quando somos pequenos precisamos desesperadamente de estabelecer esse vínculo especial com os nossos pais. Nascemos programados para estabelecer essa ligação com a nossa mãe e, nascemos sem defesas nenhumas. As crianças nascem com uma grande necessidade de estabelecer relações amorosas e completamente prontas e disponíveis para o fazerem. Nascemos totalmente vulneráveis e de coração aberto e, quando encontramos um adulto cujo coração já não está assim tão aberto, quando começamos a perceber que os nossos pais não estão assim tão disponíveis para lidar com as nossas necessidades, quando começamos a achar que o amor que têm por nós vem com algumas limitações, começamos a sentir que dói muito estarmos totalmente dependentes, receptivos e apaixonados por alguém que nem sempre parece disposto a corresponder-nos. Essas dores que se vão repetindo sempre que choramos e ninguém aparece, ou sempre que alguém nos trata mal por algo que fizemos sem más intenções, começam a acumular-se e fazem com que queiramos não precisar de ninguém. Afinal seria muito mais fácil não precisarmos tanto de pessoas que nem sempre estão disponíveis para nós. E fazem também com que nos esqueçamos que um dia precisámos tanto de alguém, precisámos tanto de ser vistos, reconhecidos, de ser acarinhados, protegidos, precisámos tanto de sentir que éramos muito bem vindos a este mundo. E assim, inconscientemente, acabamos por achar que o melhor será também que os nossos filhos não precisem muito de nós. Porque estamos feridos e já não acreditamos assim tanto na nossa capacidade de lhes dar incondicionalmente todo o amor de que precisam. E racionalizamos dizendo que é melhor assim, que serão mais independentes e felizes. Quando é justamente o contrário: é a falta de confiança no amor dos pais que faz com que os filhos não larguem as saias da mãe. Porque é esse amor que os faz sentirem-se capazes de enfrentar o mundo. É a confiança desse amor que lhes dá a liberdade de sentir que pertencem onde quer que estejam e a capacidade de explorar e investigar o mundo. Sem a certeza desse amor as crianças tornam-se ainda mais dependentes, e precisam de estar constantemente a pedir aos pais para, de várias maneiras, demonstrar que gostam delas, que lhes podem dar atenção. Uma criança que teve todo o colo de que precisou não precisa de o estar sempre a pedir. Uma criança que cresceu segura do amor dos pais pode ter a verdadeira liberdade de saber que precisa dos outros para ser feliz.

Aceitar e respeitar as necessidades dos nossos filhos torna mais fácil a vida deles mas também a nossa, porque nos permite ouvir o instinto e viver de acordo com o nosso coração deixando de lado os medos e as teorias mal fundamentadas que vêm de pessoas que se baseiam apenas no comportamento directamente observável que nem sempre é a melhor forma de avaliar as consequências dos nossos actos a longo prazo. 

1 comentário:

  1. Laura,
    Acabei de ver que iniciamos uma "amizade" no fb,
    por isso me "atrevo" a escrever...
    E agradeço por colocar este assunto mais visível.

    Um terma sem dúvida muito importante,
    e do qual quase nunca ouço falar...
    será porque nos toca tanto e a todos, de alguma maneira ou outra?

    Ontem, na interminável e cinzenta espera numa repartição da Segurança Social (fui por causa de um papel p finallizar a matricula da filha) estive atenta a quem entrava e saia, gosto de observar a nós humanos...
    E no meio do ámbiente quase fúnebre ai dentro,
    (tudo mundo em silêncio com o olhar perdido ou fixo nos ecrãs dos telemóveis)
    a única que falava era uma senhora preta com a filhinha de uns 2 aninhos...
    fiquei a observar a ambas, a proximidade o contacto contínuo, pegar-he várias vezes ao colo e dar beijinhos, conversar com ela, etc.

    A minha observação começou então a levar-me por temas diversos...
    pensei
    justamente sobre como criamos padrões de relacionar-nos entre pais e filhos, que ao parecer estão fortemente determinados pela cultura, pelas formas de ver o mundo que cada povo tem.
    Já tinha observado tb às mães de origem indiano fazer o mesmo e ficar muito perto dos seus bebés e ter muita proximidade, até cumplicidade diria.
    Observei também que essas crianças indianas pequeninas quase nunca estão a chorar ou " a estorvar " aos adultos, ao parecer são mais seguras de si, e mais sossegadas, isto é não estão o tempo todo a chamar a atenção ou a pedir coisas...

    Estando assim as coisas, chegaram mais duas senhoras pretas, ambas grávidas, que ao parecer eram amigas da primeia senhora,
    Se cumprimentaram com muita alegria,
    e a conversa então encheu a sala toda: nem parecia que estavam numa sala da Seg. Social e ter que esperar várias dezenas de atendimentos antes delas...
    Entretanto uma delas pegou no colo à pequenina, lhe fez um par de perguntas, ouviu atentamente as respostas da menina... brincou com ela um bocadinho, depois a menina foi ao colo da outra senhora recém chegada.

    Ao parecer não eram parentes ou amigas próximas pelas perguntas que se faziam davam a entender que não se veiam frequentemente...

    Entretanto chegou a minha vez de ser atendida:::

    Já ia embora ... e a última imagem que tive dessa sala foi a deste grupito de humanas a criar laços humanos, entre adultos e entre gerações.
    e saia pensando justamente como eram importante estes padrões.

    Sai mais leve e tb com um sorriso no rosto.

    Pensei, felizmente ainda existem povos com comportamento mais gregários e de maior contacto com mais proximidade.....

    África ou a ìndia ou outros povos de raiz diferente à da soc. occidental na qual vivemos, tal vez tenham muito mais que ensinar e dar à humanidade carente, que só lugares turísticos para visitar...

    Com um abraço bem apertadinho,

    Isaura Candelaria

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